Quando todo o planeta paga direitos aduaneiros
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Diz um adágio bolsista que o mercado compra o rumor e vende a notícia. Na verdade, o mercado está sempre um passo à frente. Com maior ou menor grau de sucesso, antecipa sistematicamente acontecimentos futuros. Desde que a Reserva Federal (Fed) começou a baixar as suas taxas diretoras em setembro passado, as taxas a 10 anos dos EUA subiram um ponto, de 3,6% para 4,6%. Os mercados já haviam descontado a flexibilização monetária e começam, agora, a antecipar uma inflação futura mais elevada e um aumento do prémio de risco das obrig ações de longo prazo associado, em parte, ao crescimento futuro, à introdução de taxas aduaneiras e, ainda, ao peso da dívida. Este movimento inscreve-se num ajustamento global das rendibilidades. Das grandes economias, a única exceção é a China, onde se regista um abrandamento estrutural do crescimento e uma ausência de subida dos preços.
O principal motivo de preocupação dos investidores é a inflação. Se bem que esta tenha caído em todo o mundo (de mais de 10% no final de 2022 para os atuais 4,4%), continua a ser difícil baixá-la para o nível-alvo de 2% visado pelos principais bancos centrais. Temos de admitir que é bastante difícil antecipar como vão soprar os ventos nos EUA, face aos antecipados efeitos contrários da introdução de taxas aduaneiras inflacionistas e do aumento da produção de petróleo, que, pelo inverso, se deverá traduzir por uma descida dos preços.
Uma coisa é certa: a dívida pública está a crescer! Os governos, confrontados com o envelhecimento das populações e com o aumento dos custos com a defesa e com a transição energética, também têm de lidar com a resistência populista aos cortes nas despesas públicas. Este ambiente levou o primeiro-ministro canadiano, Justin Trudeau, a demitir-se e provocou, também, instabilidade governamental em França. Nos EUA, anuncia-se uma batalha orçamental, com um novo presidente que, apesar de um défice já elevado (cerca de 7% do PIB), defende uma descida dos impostos.
O rácio dívida/PIB das principais economias ricas está a aproximar-se dos 100%, um nível em que um aumento de um ponto percentual nas taxas das obrigações poderá custar 1% do PIB ao ano.
Tal valor representa mais do que metade dos atuais orçamentos de defesa europeus. Por conseguinte, o crescimento é um fator necessário na equação de redução da dívida, mas a que preço? É um facto que a produtividade aumentou 10% em cinco anos, o que alimentou o crescimento dos EUA. Os desenvolvimentos no domínio da inteligência artificial (IA) poderão incrementar ainda mais esta tendência. Contudo, à hora da publicação desta edição, os incêndios na Califórnia continuam a lavrar e aproxima-se um ponto de viragem histórico. Em janeiro, foram propostos na Califórnia projetos de lei visando reduzir o consumo de água e eletricidade por parte dos centros de dados e da IA. Até ao presente, o alvo destas restrições tem sido o setor agrícola, mas, no futuro, a IA estará cada vez mais na mira devido ao seu apetite voraz por água. Atualmente, os EUA albergam mais de 5.000 centros de dados, os quais têm significativas necessidades de água para refrigeração, dado que uma grande parte da energia que consomem é convertida em calor. A Califórnia alberga quase 300 centros de dados (em comparação, toda a China alberga cerca de 450) que consomem vários milhões de metros cúbicos de água por ano. Mesmo que não seja por convicções políticas, o reconhecimento de que os incêndios na Califórnia podem custar aos EUA até 1% do PIB faz com que a transição energética prossiga, em parte, por razões económicas.
Num contexto em que todos os países que exportam para os EUA poderão ser potencialmente afetados pelo aumento das taxas aduaneiras e em que um possível aumento para 25% das taxas sobre as importações do Canadá e do México, conforme anunciado por Donald Trump, poderá aumentar a inflação em até um ponto percentual em 2025, adotamos, nesta edição, uma perspetiva que se opõe ao pessimismo prevalecente em relação à Europa, propondo-vos uma análise dos catalisadores que poderão reanimar o Velho Continente.
Monthly House View, 24.01.2025. - Extrait de l'Editorial
06 fevereiro 2025