Depois da perda da AAA, Trump quer garantir a sua BBB
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Os investidores particulares norte-americanos mantêm uma opinião positiva relativamente aos seus mercados de ações, nos quais continuam a investir as suas poupanças. Mas até que ponto? E até quando? A questão permanece em aberto, especialmente se tivermos em conta as crescentes expetativas das famílias norte-americanas no que respeita às medidas fiscais prometidas por Donald Trump. Enquanto se aguarda a eventual concretização dos cortes nos impostos previstos no “Big Beautiful Bill Act” (ou BBB1), os atrasos de pagamento nos cartões de crédito atingem máximos de 20 anos. Nos últimos três anos, o volume de pagamentos em atraso nos cartões de crédito aumentou quase 60%, representando 20% do total (ou seja, um em cada cinco incumprimentos). Alguns norte-americanos estão mesmo a recorrer às suas poupanças de reforma para cobrir despesas correntes, como sejam a renda da habitação ou as despesas médicas.
Os debates em torno deste orçamento, que deverá custar, pelo menos, 3 biliões de dólares ao longo de 10 anos, surgem numa altura em que a Moody’s, a última agência que mantinha a dívida dos Estados Unidos no nível AAA, baixou a sua notação. A Moody’s destaca a trajetória negativa do défice, que, segundo a sua previsão, continuará a deteriorar-se e atingirá 9% dentro de 10 anos. Este contexto orçamental tenso torna-se ainda mais difícil devido à crescente polarização da economia dos EUA, que aumenta a complexidade dos desafios financeiros do país.
De facto, é surpreendente ver até que ponto a economia dos estados democratas, conhecida como “economia azul”, difere da dos estados republicanos, conhecida como “economia vermelha”. Quase parece tratar-se de dois países distintos. Presentemente, os estados azuis têm uma economia com um PIB equiparável ao da China, ou seja, cerca de dois terços da economia dos EUA. Em comparação, a economia vermelha representa cerca de um terço do PIB dos EUA, ou seja, mais de 10 biliões de dólares. No entanto, o número de milionários cresce mais rapidamente na economia vermelha, que conta, agora, com quase metade de todos os norte-americanos com um rendimento superior a um milhão de dólares. Além disso, as expetativas de inflação e de crescimento variam enormemente entre estas duas zonas.
Até as preferências em bens de consumo e culinária são muito diferentes. No que respeita às carteiras de títulos cotados, as dos republicanos exibem um desempenho claramente superior.
Num momento em que a economia dos EUA parece mais dividida do que nunca, é fundamental encontrar formas de financiar o plano fiscal BBB. O programa de redução de custos e do número de funcionários públicos gerido pelo “DOGE” não alcançou os resultados esperados. O objetivo inicial consistia em reduzir a despesa em 2 biliões de dólares, mas, até agora, apenas foram economizados 160 mil milhões de dólares.
A outra fonte de financiamento privilegiada pela administração norte-americana reside na introdução de taxas aduaneiras. A administração dos EUA estabeleceu o ambicioso objetivo de assinar 90 acordos em 90 dias. Até à data, apenas foram celebrados dois grandes acordos: um com o Reino Unido e outro com a China. Considerando que uma tarefa desta natureza poderá demorar anos a concluir, é muito provável que os restantes 88 acordos não sejam assinados antes da data-limite de 8 de julho e que a diplomacia das negociações bilaterais sobre a questão continue bem presente durante o verão.
Neste contexto, as negociações comerciais entre os EUA e a Europa serão cruciais para a futura evolução da inflação. Revimos em baixa as nossas previsões de crescimento global para o próximo ano, sendo, também, provável uma convergência entre o crescimento dos EUA e da Europa. A inflação deverá manter-se elevada nos EUA, enquanto se deverá normalizar na Europa.
Nas nossas gestões de carteiras, continuamos altamente diversificados, privilegiando as ações de regiões que beneficiam da recuperação económica e, na vertente das obrigações, uma baixa exposição à duração norte-americana. Entretanto, continuamos a ver o ouro como o ativo de refúgio por excelência, ao mesmo tempo que nos mantemos cautelosos relativamente ao dólar. Os ativos não cotados continuam a ser atrativos e, nesta edição, analisaremos os benefícios da detenção de dívida privada nas nossas carteiras, nomeadamente através de fundos semilíquidos.
Monthly House View, 23.05.2025. - Excerpt of the Editorial

04 junho 2025